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Foto do escritorRedação

Islã ganha adeptos nas periferias de SP sem ligação com a comunidade árabe

No coração do Tatuapé, na zona leste de São Paulo, um recém-inaugurado templo religioso chama a atenção pelas grandes placas com o nome de Jesus. Mas não se trata de uma igreja cristã e sim de um centro islâmico.



À frente deste centro está o brasileiro Edmar Cândido da Silva, 34, um da'i, que significa divulgador do islã. Morador de Artur Alvim, na periferia da zona leste, ele nasceu cristão, mas se tornou muçulmano há 12 anos.


Foi em 2009, numa busca por aproximar-se de Deus, que Edmar descobriu a crença que hoje faz parte de sua vida. Passou a ler livros sobre o islã e o interesse pela religião cresceu. Foi assim que tomou a iniciativa de conhecer a mesquita do Pari, no centro da capital, local que oferecia aulas abertas sobre a doutrina do islamismo.


"Assisti à primeira aula e fez sentido pra mim. Aí veio a segunda, a terceira, a quarta, e na quinta aula eu resolvi aceitar o islã como minha crença, meu modo de vida e minha religião", conta.


Em 2010, 35 mil brasileiros se declararam adeptos do islamismo para o Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Nos últimos anos, a religião vem ganhando adeptos nas periferias de São Paulo, sem qualquer ligação com a comunidade árabe, como é o caso de Edmar.


Hoje divulgador do islamismo no Brasil, ele se formou em língua árabe pela Universidade de Al-Azhar, no Egito, e em teologia pela Universidade Islâmica de Medina, na Arábia Saudita.

Após se converter, processo que os muçulmanos chamam de "reversão", Edmar enfrentou certa resistência da família, principalmente por parte do pai.


"A gente costuma dizer para os revertidos que eles vão enfrentar essas dificuldades [de aceitação] porque o brasileiro tem muitas dúvidas sobre o que é o islã e ainda o conhece como a 'religião dos árabes'."


Apesar da fama, não foram os árabes que trouxeram o islã para o Brasil. Os primeiros muçulmanos que chegaram ao país foram os malês, povo africano escravizado pela coroa portuguesa, ainda no século 18.


Os malês, palavra que na língua iorubá significa negro muçulmano, estabeleceram-se em Salvador (BA), onde protagonizaram um dos principais levantes contra a escravização –a Revolta dos Malês.


Porém, durante o século 20, o Brasil passou a receber uma grande quantidade de imigrantes do Oriente Médio, que também trouxeram consigo a fé islâmica e por aqui fundaram mesquitas.


"O foco dessas mesquitas era atender a própria comunidade árabe, e não divulgar o islã [para o público externo]", explica Edmar.


O divulgador do islamismo e teólogo também acrescenta que situação agora mudou um pouco, devido a alguns fatos que popularizaram a religião. "Entre eles a novela 'O Clone' [da Globo], que despertou muita curiosidade das pessoas para procurarem as mesquitas e entender o que é o islã", conta.


Tamanho é o crescimento da religião na região metropolitana que existem mesquitas que passaram a dar o sermão de sexta-feira em português. Até a década passada, só se encontravam mesquitas que o faziam em árabe.


Uma dessas mesquitas é a Sumayyah, no Jardim Cultura Física, periferia de Embu das Artes, na Grande São Paulo. O templo, que começou como uma mussala (sala de orações), foi fundado pelo ex-rapper César Kaab Abdul, 48, outro brasileiro convertido ao islamismo.


César conta que conheceu o islã em meados dos anos 1980, primeiro por meio de um livro de Malcolm X e, posteriormente, com a observação dos costumes religiosos de um colega de trabalho. "Por aí, tive um conhecimento meio superficial, já que não tinha uma divulgação ampla sobre religião islâmica no país", lembra.


Mas a vontade de se converter só veio mais tarde, quando ele participava de encontros de breakdance na praça Roosevelt, na região central de São Paulo. "Nós acabávamos encontrando alguns muçulmanos, que tinham mesquitas lá na praça da República [no centro]."

Após a conversão, César percebeu que não havia locais destinados ao culto e ao ensino do islã em sua região, em Embu das Artes. Daí surgiu a ideia da criação da mesquita, que só veio receber um líder religioso dois anos após a fundação.


"Se não tivéssemos dado esse primeiro passo, talvez estivéssemos até agora sem algum conhecimento do islã. A internet ajuda bastante, mas não é a mesma coisa que estar ali de corpo presente", diz.


Líder comunitário há 35 anos, César também procurou agregar às lutas sociais de que já participava os ideais de caridade presentes no islamismo. Com isso, a mesquita se transformou num ponto de referência para a comunidade. "Fomos criando projetos, como entrega de cestas básicas, de marmitas, criamos uma farmácia, damos assistência médica e jurídica", conta.


Ele conta que, no início, enfrentou preconceito dos moradores e que a comunidade via a mesquita com um olhar desconfiado. Mas, hoje em dia, a relação mudou e o local virou uma referência positiva na vizinhança.


"A gente está sempre tentando desmistificar parte do que as pessoas têm de ponto de vista do islã, ou do que a mídia de forma errônea sempre está divulgando", diz ele.


Sobre a intolerância religiosa, César cita uma passagem do Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos: "'quando os ignorantes vierem debater com você, que você diga salam (paz)'. Na maioria das vezes é o nosso posicionamento".


A mesquita Sumayyah é aberta para visitação às quartas, das 10h às 20h, e às sextas-feiras, das 13h às 21h.

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